Larga maioria das pessoas que recebiam salário mínimo em julho de 2020 passaram a receber o novo valor mínimo um ano depois. Há, no entanto, “sinais de relativo dinamismo” e progressão no mercado.

Mais de três quartos (77,6%) das pessoas que recebiam o salário mínimo em julho de 2020 (635 euros brutos) continuaram a receber o novo salário mínimo um ano depois (665 euros), revela o estudo do Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP) que foi elaborado para a reunião de concertação social sobre o assunto, mas que não chegou a ser enviado aos
parceiros sociais.

O documento, disponível na íntegra na página oficial do GEP, tem por base a análise aos escalões de remunerações feita através das declarações entregues pelas entidades patronais à Segurança Social de 2,3 milhões de trabalhadores por conta de outrem ou membros de órgãos estatutários.

O estudo começa por concluir que “a grande maioria (77,6 %) dos trabalhadores/as que, em julho de 2020, recebiam a retribuição mínima mensal garantida de 2020 (635 euros) passaram, em julho de 2021, a receber a retribuição mínima mensal garantida de 2021 (665 euros)”

Só cerca de um quinto (20%) desses trabalhadores – que deverão rondar as 700 mil pessoas – passou para escalões de remuneração acima do novo salário mínimo, e só 11% subiram para um escalão acima do futuro montante proposto pelo Governo para 2022 (705 euros brutos por mês).

No entanto, a maioria dos que no ano passado tinham já uma pequena vantagem, na medida em que recebiam um pouco acima do salário mínimo (estavam no escalão entre os 635 euros de então e os 665 euros deste ano), não fica colada ao novo valor: isso aconteceu com menos de metade (44%), enquanto a percentagem dos que passaram para escalões acima do atual salário mínimo foi de 54%.

Esta caracterização é interessante à luz do debate sobre os níveis salariais em Portugal e sobre as compensações às empresas abrangidas. Embora a ideia seja atenuar o custo de uma decisão do Governo, o subsídio acaba por premiar quem mantém salários no valor mínimo ou próximo dele, sobretudo quando o incentivo se repete. O Governo já assumiu que reeditará o apoio em 2022, embora eventualmente para um grupo restrito de empresas mais vulneráveis (a ser fechado na próxima sexta-feira).

Este ano, por exemplo, o apoio pago através do IAPMEI consistiu num subsídio de 84,5 euros por cada trabalhador que passou do mínimo de 2020 para o mínimo de 2021 (o que no estudo corresponde aos tais 78%, embora a execução do apoio tenha ficado abaixo do previsto). Já no caso dos trabalhadores do escalão seguinte, que auferissem entre 635 euros e 665 euros e que ficaram neste último valor (44% segundo o estudo), o subsídio foi de 42,25 euros.

O setor da limpeza, por exemplo, foi um dos que contestaram a exclusão do apoio por ter um contrato coletivo que ao salário mínimo acrescenta 0,5%. Os autores dizem ainda que “o chamado efeito de arrastamento foi mais pronunciado no conjunto dos trabalhadores que recebiam exatamente [já] 665 euros em julho de 2020”, com 57% a passar para o escalão seguinte.

Embora não se saiba com precisão quantas pessoas recebiam o salário mínimo em julho do ano passado, sabe-se, por dados do Governo, que eram cerca de 721 mil em setembro do mesmo ano. O Negócios pediu atempadamente ao Governo que divulgasse os números absolutos que estão subjacentes a estas percentagens, o que permitiria complementar as conclusões, mas não obteve resposta até ao fecho desta edição.

O que o Ministério do Trabalho (MTSSS) justificou foi o facto de o estudo assumir que tanto em 2020 como em 2021 havia pessoas a ganhar abaixo do mínimo. “Sendo recorrente e em percentagens reduzidas” a existência de salários abaixo do mínimo “pode ser explicada por remunerações de trabalhadores a tempo parcial ou com remunerações incompletas (por exemplo, por motivo de doença)”.

Quem mudou de emprego progrediu mais.

Os autores vão ver depois o que aconteceu a quem ao longo destes doze meses mudou de emprego (menos de um décimo de todo o universo analisado) e concluem que “a mudança de emprego pode estar associada a uma maior probabilidade de progressão salarial”.

Isto porque nesta pequena fatia de trabalhadores que mudou de emprego 41% dos que recebiam o salário mínimo de 2020 (635 euros) passaram a receber acima do salário mínimo de 2021 (665 euros), o que compara com 18% no caso de quem ficou no mesmo estabelecimento ou empresa.

Assim, “pese embora os dados apurados levem a concluir que a atualização da RMMG desloca a maioria dos trabalhadores que tinham remunerações até ao valor da RMMG para o novo limiar, e apesar de o efeito de arrastamento ser moderado nos escalões não imediatamente acima da RMMG, existem sinais de relativo dinamismo e margem de progressão salarial no mercado, ainda que com frequência relativamente limitada” e associada às situações com menor expressão de mobilidade.

Publicado em: https://www.jornaldenegocios.pt/economia/emprego/mercado-de-trabalho/detalhe/tres-quartos-das-pessoas-ficaram-presas-ao-salario-minimo