Guia sobre o que muda no Código do Trabalho

Governo, patrões e UGT assinaram nesta segunda-feira um acordo de concertação que, defendem, ajudará a combater a precariedade e a promover a negociação colectiva. Veja aqui as principais alterações.

O primeiro-ministro, António Costa, as quatro confederações patronais e a UGT assinaram nesta segunda-feira um acordo para a revisão do Código do Trabalho, que dá corpo ao entendimento alcançado na concertação social no final de Maio. O acordo, tal como o seu nome indica, visa “combater a precariedade e reduzir a segmentação laboral e promover um maior  dinamismo da negociação colectiva”.

A proposta de lei  do Governo, que já está no Parlamento, será discutida a 6 de Julho na generalidade. Porém, as soluções encontradas pelo Governo merecem críticas do PCP e do BE. O PS já disse que irá apresentar propostas de alteração, assim como o PSD e o CDS.

O limite máximo dos contratos a termo certo passará de três para dois anos e a duração total das renovações não poderá exceder a do período inicial do contrato. O limite máximo dos contratos a termo incerto é reduzido de seis para quatro anos.

É ainda eliminada do Código do Trabalho a norma que permite a contratação a termo para postos de trabalho permanentes de jovens à procura do primeiro emprego e de desempregados de longa duração. Essa possibilidade apenas é permitida quando estão em causa desempregados de muito longa duração (no desemprego há mais de dois anos). A possibilidade de contratar a termo no caso de lançamento de nova actividade de duração incerta ou de abertura de novo estabelecimento ficará limitada às empresas com menos de 250 trabalhadores (agora é 750).

Esta medida terá o acordo do BE e do PCP, mas combinada com outras poderá levantar problemas entre os parceiros do Governo.

Contratos de curta duração alargados a mais sectores

A duração máxima dos contratos de muito curta duração será alargada de 15 para 35 dias e permite-se que possam ser celebrados em qualquer sector (agora é apenas na agricultura e no turismo) em caso de “acréscimo excepcional e substancial da actividade da empresa cujo ciclo anual apresente irregularidades”, decorrentes do mercado ou por motivos estruturais. O Governo defende que esta medida é uma forma de combater o trabalho informal, mas a esquerda critica a solução – que entrou no pacote legislativo à última hora – por entender que pode haver um uso abusivo destes contratos, em alternativa à contratação ao termo.

Fim do banco de horas individual será faseado

O Governo elimina a possibilidade de as empresas terem bancos de horas por acordo individual, tal como previa o seu programa. Mas os existentes não vão acabar de imediato e poderão manter-se durante o prazo máximo de um ano, contado a partir da entrada em vigor das novas regras. Na prática, o Governo dá tempo às empresas para se adaptarem às novas regras, algo que poderá encontrar entraves no Parlamento por parte da esquerda. A direita também coloca problemas, com o PSD e o CDS a não concordarem com o fim deste mecanismo.

Banco de horas por acordo de 65% dos trabalhadores

Contratos temporários com máximo de seis renovações

Os contratos de trabalho temporário terão um limite máximo de seis renovações, algo que agora não existe na lei. A empresa será ainda obrigada a informar o trabalhador temporário do motivo subjacente à celebração do contrato e a empresa utilizadora será obrigada a integrar o trabalhador no quadro se as regras forem violadas. Elimina-se ainda o prazo de aplicação das normas das convenções colectivas aos trabalhadores temporários. Estas mudanças foram negociadas com o BE e merecem o seu acordo.

Período experimental alargado

Ao mesmo tempo que elimina a norma que permite a contratação a prazo para postos permanentes de jovens e desempregados de longa duração, o Governo propõe alargar de 90 para 180 dias o período de experiência exigido a estes trabalhadores, quando são contratados para o quadro. O período de estágios dispensará a existência de período experimental.

O Governo argumenta que este período experimental já existe para cargos de complexidade técnica e que é justo que o período experimental seja mais alargado para quem não tem experiência ou está há muito tempo afastado do mercado de trabalho. A esquerda não aceita a medida e, tal como a direita, alerta para os riscos de inconstitucionalidade, enquanto o PS se preparar para propor uma norma travão para evitar abusos.

Taxa de rotatividade mas com excepções

As empresas que recorram de forma sistemática à contratação a termo certo e que ultrapassem a média sectorial serão obrigadas a pagar uma taxa anual que poderá chegar a 2%, que incidirá sobre a massa salarial dos trabalhadores com este tipo de vínculo. Haverá excepções aos contratos a termo para substituição de trabalhador em licença parental ou de baixa por doença por período igual ou superior a 30 dias e aos contratos de muito curta duração. Também serão excepcionados os contratos a termo por imposição legal ou devido à situação do trabalhador.

O PCP entende que esta medida vai “legitimar a precariedade”. O BE defende a medida, embora questione as excepções tal como o PS. A direita ainda não se pronunciou sobre ela.

Fundamentar denúncia das convenções e pedir mediação

O executivo vai manter a caducidade das convenções colectivas, ao contrário do que defendem a CGTP, o PCP e o BE, mas introduz algumas regras para evitar a denúncia das convenções sem fundamento e os impasses na negociação. Assim, a denúncia tem de ser acompanhada de fundamentação, nomeadamente se há motivos de ordem económica, estrutural, desajustamentos ou a existência de outros instrumentos de regulamentação colectiva no sector ou na empresa. Esta documentação deve também ser enviada à Direcção-Geral do Emprego e das Relações do Trabalho (DGERT), para que esta entidade possa acompanhar o processo.

A proposta passa ainda por permitir que uma das partes da negociação possa pedir a suspensão temporária do prazo de sobrevigência (o período entre a denúncia do contrato e a sua extinção) até um máximo de seis meses e solicitar uma mediação que ficará a cargo dos árbitros registados no Conselho Económico e Social.

Para o PCP a caducidade deve ser eliminada do Código do Trabalho, algo que o BE também gostaria que acontecesse. PSD e CDS ainda não se pronunciaram sobre a solução que tem como objectivo, assumido pelo Governo, dinamizar a contratação colectiva.

Trabalho extra nas convenções só se for mais favorável

O princípio do tratamento mais favorável será alargado ao pagamento do trabalho suplementar. Na prática, a norma prevista no Código do Trabalho e que estipula a forma como é pago o trabalho extra só pode ser afastada por convenções colectivas se elas forem mais favoráveis do que a lei. Será ainda alargado o núcleo de matérias que se mantêm em vigor em caso de caducidade. Em particular os regimes de parentalidade e de segurança e saúde no trabalho quando são mais favoráveis do que a lei.

Reforçar a inspecção do trabalho

A par das alterações ao Código do Trabalho, o Governo compromete-se a reforçar os meios da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), concluindo os processos de recrutamento em curso e lançando um novo. Pretende-se ainda reforçar os meios técnicos na área da segurança e saúde no trabalho e na análise dos processos contra-ordenacionais. Na orgânica da ACT, será integrado “de modo expresso” o combate à precariedade laboral. Esta tem sido uma reivindicação do PCP e do BE, que teve acolhimento do Governo.

Simplificar de procedimentos

A desmaterialização dos contratos de trabalho a termo e temporário é uma das medidas propostas. Ao mesmo tempo, o Governo compromete-se a desenvolver uma plataforma única de comunicação dos novos contratos à Segurança Social e ao Fundo de Compensação do Trabalho, para facilitar a vida às empresas.

Publicado em: https://www.publico.pt/2018/06/19/economia/noticia/o-que-muda-no-codigo-do-trabalho-1834749